sábado, 20 de dezembro de 2008

ARTIGO

A ECONOMIA DA TECNOLOGIA IMPERFEITA

Poderiam citar-se numerosos exemplos que sustentam
que o pensamento de Aristóteles
está impregnado da teleologia do trabalho.
A.Heller

Uma aproximação ao debate

O tema deste ensaio é o papel do valor social incorporado na tecnologia na configuração de alternativas de desenvolvimento para a economia de hoje. Entende-se que o papel da tecnologia na formação do sistema produtivo muda continuamente e que não pode ser adequadamente percebido enquanto não se reconstitui a inter-relação entre ciência e tecnologia. A técnica é um aspecto fundamental da vida social no que ela não pode deixar de ser ação encaminhada através de modos regulares de fazer o mesmo. No mundo antigo a técnica foi concebida como o modo como o trabalho pode ser dirigido por um principio do bem social. Na versão mais madura da leitura antiga do tema, a técnica em Aristóteles tem a conotação de um saber fazer reflexivo. A tecnologia, que seria o mundo das técnicas na linguagem de hoje, encerra uma teleologia do trabalho. Com Copérnico, a ciência adota um caminho em metodologia que abre espaço para uma tecnologia científica. Mais tarde, com o Iluminismo, a tecnologia descola de práticas místicas e se confunde com o nascimento da ciência.

No mundo da sociedade industrial moderna a técnica foi separada dessa dimensão reflexiva, tornando-se um modo de fazer destituído da possibilidade de sustentar uma consciência crítica do mundo. Na sociedade industrial aparece uma valorização da técnica como campo preferencial comparada com uma ciência teórica supostamente distanciada do mundo da prática. A situação mais avançada dessa separação é o uso racional da tecnologia pelos regimes de força. Destituída de seu fundamento em juízos de valor, a tecnologia torna-se o fundamento de um mercado socialmente imperfeito.

Na Economia Política a tecnologia aparece sob luzes muito diversas, segundo é vista na perspectiva do funcionamento do sistema produtivo em seu conjunto, na de uma teoria do investimento, na da engenharia da produção, ou ainda, segundo se reflete na perspectiva do efeito emprego da formação de capital. Na linguagem comum do desenvolvimento industrial, a tecnologia ficou basicamente associada a engenharia e seus objetivos já estariam pré-determinados como de resolver problemas operacionais do sistema produtivo. Em todo caso, o papel da tecnologia na economia não se desvencilha de duas referências principais, que são as condições de mercado e os mecanismos de poder.

No campo da análise econômica oficializada definiu-se uma diferença marcante entre a postura dos pós-keynesianos da primeira hora como Joan Robinson e Nicholas Kaldor, que se ocuparam do movimento geral da tecnologia e dos neo-schumpeterianos como Richard Nelson, que identificam progresso técnico com inovação. Para os primeiros, o progresso técnico é o meio por excelência de transformações do sistema produtivo, mas deixa indeterminado qual progresso técnico e em qual momento do sistema produtivo. A visão neo-schumpeteriana desdenha ou ignora o os efeitos inerciais da operação das técnicas já incorporadas na produção, que seria o equivalente ao espaço negro da Física. Ambas as posturas são inadequadas para uma teoria do desenvolvimento, que tem que se ocupar dos processos sociais de apropriação de tecnologia. Tal apropriação não é perfeita, primeiro porque jamais acontece em condições de concorrência perfeita e segundo, porque se torna um poderoso mecanismo de poder. A imperfeição da tecnologia decorre de sua impossibilidade de se reproduzir por seus próprios meios, sem a ajuda de uma racionalidade anterior. Tal racionalidade é a do sistema de poder incorporado na indústria em seu sentido mais amplo, que se projeta sobre os rumos dos investimentos industriais, inclusive daqueles que se transformam em despesas, públicas e privadas, com a atividade científica. Mas a função tecnológica obriga a um retorno das decisões políticas a opções práticas organicamente incorporadas ao sistema produtivo.

Um debate radical sobre o significado social da tecnologia tornou-se imperativo desde que ela foi apropriada por cientistas de origens diversas interessados em usá-la para seus próprios fins políticos. Esta observação não é uma declaração weberiana sub-reptícia por uma ciência neutra, senão de assinalar o processo de controle sutil da produção científica e de seus desdobramentos tecnológicos, por parte do bloco de poder prevalecente. Tanto como a tecnologia regula as condições materiais do uso de trabalho, ela constitui a referência da divisão do trabalho e do modo de remuneração dos trabalhadores empregados. Por isso, desde o capítulo seminal de Ricardo sobre este tema, tornou-se clara a necessidade de reconhecer que há um determinado processo de substituição de técnicas que acompanha a formação de capital e que esse processo aparece, alternativamente, como positivo, neutro ou negativo em relação com a criação de empregos. Os efeitos negativos do progresso técnico se traduzem em queda da taxa de salário na distribuição da renda.

A rigor, questionar o significado social da tecnologia implica em rever o fundamento de classe do autoritarismo lógico que preside a ciência burguesa (Adorno, 1986). Além disso, por reconhecermos a situação histórica do trabalho científico, trata-se de ver a produção científica como parte do trabalho social, no sentido hegeliano de universalidade do trabalho e de interdependência sócio-histórica de todos os trabalhos
[1]. Define-se, portanto, que o debate sobre tecnologia se desenvolve sobre um fundamento filosófico irredutível, onde se adverte o papel dos processos da tecnologia na inter-relação entre a sociedade e a natureza e nos movimentos combinados e contrários de valorização social e de desvalorização.

Pretendemos aqui esboçar uma reflexão crítica sobre as condições sociais da produção e do uso de tecnologia na sociedade globalizada de hoje, especialmente, no alargamento ou no estreitamento do horizonte de possibilidades de superação das tendências à desigualdade, inerentes à economia mundial. Nesse intento, tratamos a tecnologia como um processo inerente às transformações do sistema produtivo, que se configura como resposta a necessidades práticas do funcionamento do sistema produtivo. Assim como é ingênuo supor que todas as idéias tecnológicas são novas, é igualmente simplório não perceber que as soluções de problemas técnicos se situam em um nível geral de desenvolvimento do sistema produtivo. No linguajar da Economia Política, diremos que as tecnologias atuais correspondem a uma composição do capital, inclusive a uma capacidade da sociedade de mobilizar conhecimento existente para novas finalidades. Trata-se, portanto, de conhecimento adquirido e de poder para usar conhecimento.

Tal abordagem implica em trabalhar com a relação entre ciência e tecnologia e com a relação entre modelo político e políticas tecnológicas. A produção científica acontece em determinados contextos de poder, em que sempre houve um jogo entre os interesses dos cientistas e o acesso ao poder – Arquimedes e Hierão de Siracusa e Einstein e Roosevelt – e um jogo dos poderosos de usarem talento criativo para reforçar seu poder: os Visconti e Leonardo da Vinci. O desenvolvimento de tecnologias da era da produção industrial logicamente responde à aceleração do tempo causada pela automação. A ligação entre ciência e tecnologia tornou-se mais indireta e mais distante, entretanto mais profunda e conseqüencial. Passou-se a precisar de uma concepção de ciência capaz de gerar tecnologia e de uma tecnologia de base científica
[2]. Frente à separação entre ciência e tecnologia propõe-se uma abordagem baseada na composição de ciência e tecnologia onde há um desenvolvimento combinado das duas.

A primeira distinção entre ciência e tecnologia está em seu sentido de finalidade. A ciência pode aspirar a ser um conhecimento independente de finalidade imediata – apesar do controle do Estado e das empresas sobre a produção científica – mas a tecnologia, por definição, é um conhecimento direcionado para obter resultados específicos na esfera da produção. Há uma dupla relação entre ciência e tecnologia, em que há uma aparente separação entre esses dois campos relativa ao seu sentido de finalidade e uma conexão real dada pelo controle do Estado e das empresas sobre a produção e os usos de conhecimento, apesar das possibilidades de uma atividade científica ideologicamente independente. Paralelamente, há uma pretensão da esfera tecnológica de progredir como um campo separado, ou com regras diferentes daquelas da ciência, mas essa é uma separação que esgota as possibilidades de expansão criativa da tecnologia.

Assim, torna-se necessária uma leitura crítica da tecnologia, numa perspectiva histórica da atualidade. A expressão tecnologia transmite uma noção de poder associada ao pressuposto de que ela corresponde a algum tipo de poder sobre a natureza, derivado de um saber prático socialmente incorporado. Nesse sentido, a tecnologia será um saber prático compartilhado por uma certa comunidade – ostensiva ou não – que representa um processo de apropriação de recursos naturais, mediante a capacidade de comandar trabalho. Assim, a tecnologia é poder em dois sentidos: no poder positivo de fazer algumas quantas coisas e no poder negativo de separar essa capacidade de fazer de seu fundamento doutrinário inicial, isto é, de seu fundamento científico.

Aqui olhamos, portanto, para a tecnologia como para um segmento do processo de produção que se realiza em partes da sociedade que concentram poder e que também têm a capacidade de administrar a distribuição sodcal do poder. As decisões sobre os usos de tecnologia, já sejam elas conscientes ou não, são essenciais ao modo de desenvolvimento do sistema em seu conjunto. É preciso certo nível de desenvolvimento do trabalho para gerar tecnologia e é preciso certas outras condições de inserção dos trabalhadores no sistema de produção para que se absorvam tecnologias.

Revela-se, portanto, uma identidade social dos processos da tecnologia. Longe de vê-la por seus aspectos terminais, mecânicos, da engenharia de processos de produção, procura-se vê-la como processo social de poder, cujas materializações são socialmente controladas. Tanto como a tecnologia é o meio operacional de realizar os processos de produção necessários à reprodução do capital, o controle social da tecnologia é, também, o controle dos rumos da acumulação de capital, pelo que é preciso analisar a transformação por seus efeitos dinâmicos sobre o futuro do sistema produtivo e não só por seus efeitos diretos e indiretos imediatos.

Nas sociedades industriais as tecnologias são desenvolvidas para responder a interesses organizados, que se manifestam desde o nível mais amplo das decisões financeiras do grande capital até as decisões operacionais das empresas. Essa cadeia de decisões alcança os pequenos produtores e inclusive aqueles que operam em forma local e nos espaços da chamada economia solidária. Mas seu desenvolvimento depende de um fundamento científico e de uma pesquisa operacional que se realiza na esfera das empresas, isto é, uma pesquisa a que têm acesso aquelas empresas que operam no nível das que têm a capacidade de renovar tecnologia. Está implícito que a capacidade de se renovar em tecnologia não só é desigual como está restrita a aquelas empresas que têm acesso a laboratórios de ciência e de fábrica. A grande alternativa têm sido as universidades, onde em muitas delas surgem projetos que podem ser considerados detentores de uma perspectiva não controlada e potencialmente renovadora.

No desenvolvimento da sociedade capitalista moderna há uma aparente separação entre ciência e tecnologia, que dá lugar a uma “lógica” da tecnologia diferente da lógica da ciência, que seria a produção de conhecimento. A lógica da tecnologia seria de exploração do potencial operacional do conhecimento, independentemente do significado inicial desse conhecimento, considerando que o significado do conhecimento muda ao longo do tempo. Por conseguinte, pode-se argüir que a lógica da tecnologia é, em última análise, uma lógica dependente daquela da ciência. Mas essa separação é apenas superficial, pela simples razão que o desenvolvimento basilar da ciência, como mostrou Whitehead (1949) gira em torno de problemas fundamentais e de respostas que dão continuidade à reflexão criativa.

Surge, portanto, uma questão incontornável, que se refere ao papel da tecnologia na reprodução da produção capitalista em seu conjunto e em seu sentido mais amplo, que é um papel no encadeamento do processo e não apenas de ver os efeitos da atual tecnologia na atual produção capitalista, portanto, de visualizar o papel da produção social de tecnologia na produção social em seu conjunto. Noutras palavras, descobre-se uma função mais profunda da tecnologia, que é de se desenvolver de modo complementar com a ciência, ou de realizar a ligação entre a pesquisa científica e o mundo das práticas.

A questão fundamental que nos guia nesta pesquisa consiste em reconhecer que a produção capitalista acentua uma tendência inerente aon movimento do capital em geral no mercado, que procura respostas mais eficientes à captação dos resultados do trabalho, tanto diretamente na produção como indiretamente, através dos sistemas de comercialização. Daí, que o processo social da tecnologia seja um processo induzido pelo movimento da formação de capital e esteja situado no contexto político do poder.

A produção social de tecnologia é uma combinação de reavaliações de aspectos positivos e negativos das técnicas e das combinações de técnicas segundo os interesses imediatos do capital e o potencial de conflito que sua aplicação revela. A noção de que esse processo envolve riscos de diversos tipos precisa ser revista. Custos sociais e riscos estarão envolvidos na escolha e na aplicação de técnicas em todos os níveis de complexidade em que operam as sociedades de hoje. Mas há riscos que surgem do que se decide fazer e riscos que decorrem do que não se faz. A passividade frente aos problemas do eixo ciência-tecnologia torna-se um fator de envelhecimento da pesquisa e do ensino e dá lugar a soluções superficiais e parciais como aquelas que podem ser realizadas no plano dos trabalhos interdisciplinares. A insistência no tratamento de alguns problemas básicos pode ter resultados inquestionáveis, por exemplo, como os alcançados por Piero Sraffa com um livro que tardou quarenta e dois anos para ser terminado. A partir daquela reflexão passamos a pensar em termos de blocos tecnológicos e de momentos do desenvolvimento da tecnologia que explicam as posições relativas de preços das mercadorias.

O humanismo negativo da eficiência na redução do emprego

O questionamento sobre tecnologia é indissociável de um princípio geral de eficiência, que aparece na forma também geral de produtividade ou como uma economia força ou como uma economia de trabalho. A eficiência é um principio imponderável que sintetiza as relações entre quantidade de recursos e resultados e entre resultados quantitativos e qualidade dos resultados. Mas, em um sistema social, a eficiência, como mostrou Marx, depende do ajuste entre os novos componentes do capital e os que já se encontram em operações. A eficiência não é um principio socialmente neutro. Assim, é uma referência móvel que nos indica em que direção o sistema se move, através de certas seqüências de seleção de técnicas.

Quando confrontada com efeitos sociais, a eficiência torna-se uma medida do capital sobre o conjunto das pessoas que precisam trabalhar para viver, já seja que estejam ocupadas ou não. A eficiência surge do controle do trabalho. Por isso, na produção capitalista a eficiência indica a capacidade dos capitalistas de manejar os trabalhadores do mesmo modo como a mobilidade registra o interesse dos trabalhadores. Nesse contexto, a noção de necessário corresponde a situações específicas de reprodução do capital em que se trabalha com situações equivalentes de tecnologia.

A sociedade do capital não tem uma resposta socialmente convincente para o fato de que a formação de riqueza no ambiente da produção industrial se faz mediante uma lógica de eficiência que substitui trabalho vivo por trabalho morto, que aumenta a eficiência final do trabalho reduzindo o número de trabalhadores empregados, bem como reduzindo a intensidade da ocupação dos que permanecem engajados na produção. Os trabalhadores são convidados a se identificarem ideologicamente com as empresas e são instados a arcarem com os custos de seu próprio aperfeiçoamento e atualização, que são requisitos formais mínimos de emprego
[3] . Mas são padrões de qualidade do trabalho aferidos frente a conjuntos de tecnologias que serão superados. Em cada situação o uso de tecnologias é uma imposição sistêmica, que passa aos diversos integrantes do sistema definindo uma linha de sobrevivência, convertendo-se em pauta de comportamento nas relações entre capital e trabalho. Assim, a renovação tecnológica torna-se uma extensão da divisão do trabalho, com o poder de pré-determinar a distribuição da renda. Para descobrir o significado social da renovação tecnológica teríamos que ligar este impacto na distribuição da renda com a queda do multiplicador do emprego. O movimento geral da tecnologia reaparece como um movimento de controle indireto dos trabalhadores através da incerteza de sua renda.

Distinguiremos, portanto, um significado social conseqüente da mecânica da substituição de técnicas e um um fundamento ideológico, dado pela preferência do capital por estratégias de defesa da taxa de mais valia baseadas no controle do efeito emprego da renovação técnica, comparadas com outras possíveis estratégias voltadas para a seleção de composições alternativas de capital. Nesta perspectiva, o emprego não é apenas uma fonte de renda: é o modo de identificação das pessoas como trabalhadores e mais, como detentores de uma identidade que emana de sua capacidade atual de vender seu tempo e de sua capacidade de se separarem da lógica do capital mediante estratégias de mobilidade. A tendência geral à diminuição do efeito emprego dos investimentos coloca a tecnologia como uma ferramenta de poder que se administra de modo diferenciado, segundo a composição do emprego corresponde a diferente capacidade das pessoas de sobreviverem sem a dependência do emprego e de serem capazes de chegar a pautas independentes de comportamento.

Na sociedade da produção industrial avançada, tanto nas economias centrais como nas periféricas, a produção se torna mais internacionalizada e com um componente maior de serviços, e, principalmente, com um descolamento do capital financeiro especulativo frente à circulação financeira do sistema produtivo. Este perfil de funcionamento do capital significa modos mais indiretos de controle do trabalho, que não é imaterial nem muito menos, mas que muda constantemente de composição, segundo mudam os requisitos de qualificação dos trabalhadores
[4]. A criação de valor se faz mediante relações de produção que se tornam mais complexas e indiretas, mas que abrangem o conjunto das etapas de produção, desde as mais simples até as que aparecem no mercado na forma de serviços. A grande novidade desse sistema é a diluição das decisões do grande capital, onde a maior concentração em menor número de empresas corresponde a maior peso de investidores individuais no mercado financeiro. Surgiu de uma brecha no funcionamento do capital financeiro que, com a atual crise em marcha, deixou o sistema bancário em dependência mais direta de intervenções estatais. A configuração desses novos limites da operação do capital financeiro coloca a questão da tecnologia sob nova luz, obrigando a rever seu fundamento político.

A dimensão política do processo técnico

Como processo técnico aqui se entende o modo como a sociedade resolve seus problemas práticos de produzir e de consumir. Produção e consumo estão atrelados a formas de organização de transportes e de energia estratégicas nas conexões entre produzir e consumir. A produção de serviços é parte da produção de bens e vice versa.

O processo técnico se materializa assumindo diversas formas, com variada abrangência no sistema produtivo e com diferente duração, na reprodução do sistema produtivo em seu conjunto. O processo técnico é ativado por demandas sociais estabelecidas pela sobrevivência e por aquelas outras ditadas pelos interesses na acumulação de capital. Assim, o processo técnico concreto é um processo social que carrega a intencionalidade das ações dos grupos que controlam o capital. A questão social da tecnologia, portanto, se remete ao modo como a estruturação social se resolve numa organização social de controle do processo técnico, ligando a renovação tecnológica à valorização e à desvalorização, frente à percepção da descontinuidade inerente ao modo como o sistema produtivo escolhe produtos e cria novas necessidades, Assim, longe de pensar no processo técnico como algo separado da lógica da acumulação de capital, se focaliza nas inter-relações entre as necessidades específicas dos capitais individuais para se recomporem e as condições gerais de reprodução do sistema produtivo no ambiente econômico e político em que eles operam. Daí, decorre que há diferentes políticas tecnológicas dos diversos produtores individuais, que operam, de modo interativo, no mercado de tecnologia onde, entretanto, predominam aqueles poucos agentes que chegam a ganhar e a manter posições vantajosas no aproveitamento da tecnologia como meio de operacionalizar a acumulação. O potencial político da tecnologia aparece, portanto, nas relações de poder entre produtores e usuários de tecnologia, desdobrando-se em relações na esfera dos que têm a capacidade de intervir na produção de tecnologia e na esfera dos que têm acesso restrito ao seu uso. A questão já citada de elevação tecnológica em todos os níveis operacionais do sistema produtivo torna necessária uma política de desenvolvimento tecnológico direcionada para remover problemas e não apenas para atender demandas circunstanciais de empresas.

Em sua condição de saber técnico localizado, a tecnologia é socialmente inerte. Mas, com seu fundamento cientifico e com o reconhecimento de sua inserção social recupera seu potencial criativo, podendo ser referência para a própria pesquisa científica. Na prática, a tecnologia se torna socialmente significativa quando se define seu fundamento político. Tanto como o controle da tecnologia é uma manifestação de poder, a tecnologia em si só é socialmente significativa quando é absorvida pelo sistema político; e se converte em instrumento de uma relação específica de poder. O poder de conduzir a movimentação da tecnologia é o poder de controlar as relações entre capital e trabalho em torno de empreendimentos ativos. Essa relação de poder é o verdadeiro centro das políticas de ciência e tecnologia, que permite dar unidade a iniciativas em um campo tão variado.

O substrato político da tecnologia aparece nas orientações de política tecnológica, no modo de conduzir as relações entre Estado e empresa e nas relações entre empresas que têm diferentes condições de participar no mercado. Não há fundamento para que se pense em termos de monopólio natural, mas sim de que se reconheçam os efeitos da concentração de capital nas iniciativas em tecnologia. O mercado da produção de tecnologia é basicamente um mercado oligopolístico organizado em forma de pirâmide, onde o topo é ocupado por um pequeno número de empresas que operam com alta tecnologia. Será preciso distinguir entre as empresas que são capazes de produzir tecnologia, portanto, que podem vender tecnologia como mercadoria; as empresas que dispõem de recursos suficientes para manterem-se atualizadas comprando tecnologia e as que operam em faixas de mercado marginalizado com tecnologias dominadas. Essas diferenças de condições de participação no mercado indicam condições de controle sobre a capacidade explorar os usos das técnicas conhecidas, isto é, avaliar experiências e resumem um poder incontestável sobre as opções de mobilidade dos trabalhadores
[5]

As condições de participação dos trabalhadores são conseqüentemente diferenciadas. Nas primeiras há espaços de trabalho em expansão, portanto, há condições que podem ser aproveitadas pelos trabalhadores para ganharem mobilidade mesmo que seja apenas em condições temporárias. Na terceira o trabalhador é reduzido à condição de meio de produção e suas chances de ganhar mobilidade são praticamente nulas. Em ambientes de intensa renovação técnica tem que haver correspondente renovação da qualificação, pelo que, mais uma vez trata-se de um pacto de poder consentido ou conflitivo.

A movimentação da tecnologia representa um pacto do bloco de poder, entre interesses de empresas e de capitalistas individuais – operando através dos mecanismos impessoais do mercado - que procura garantir o controle da acumulação através do controle das variações de produtividade. O reconhecimento desses processos leva a uma excursão pela teoria Política em que se procura passar dos aspectos superficiais da renovação tecnológica aos seus aspectos mais profundos.
Informação na tecnologia : a autoreflexão do conflito negado

Em sua qualidade de instrumento de uma determinada política de investimento, isto é, em sua condição de instrumento de um determinado movimento do capital, a tecnologia se torna a expressão de uma forma de controle social e de recursos, por isso, encobrindo uma relação capital/trabalho penetrada pela meta do capital, de reduzir a participação do trabalho na renda e uma relação socialmente conflitiva com o ambiente, dada pela tendência ao desgaste de recursos não renováveis. Nesse ponto se delineia uma nova função do Estado, que compreende identificação de objetivos em longo prazo, iniciativa na articulação entre as esferas pública e privada.

A principal questão no debate sobre tecnologia no discurso da operacionalidade é que esse fundo de relações conflitivas é negado pelo discurso da operacionalidade e que a tecnologia é apresentada apenas em sua positividade, que é a perspectiva do capital investidor. O reconhecimento da tecnologia como um campo conflitivo em que há disputas entre técnicas soma-se à compreensão do mercado como um campo de força, onde se ajustam interesses contraditórios. O uso de tecnologia é o meio pelo qual as empresas fazem valer seu poder de escolher processos de produção e modos de comercialização. Por isso mesmo, é uma linha de choque de conflitos de interesses.

A sucessão de escolhas sobre tecnologia em geral compreende escolhas de soluções técnicas específicas e de escolhas de tecnologias, e resulta em seqüências de decisões interdependentes que levam, objetivamente, a trajetórias de modos tecnológicos de operar, que condicionam cada nova decisão nesse campo. Há, portanto, uma questão relativa ao conhecimento do processo da tecnologia em seu conjunto, como parte da dimensão subjetiva desse processo, e uma questão relativa a informação da tecnologia, que se converte em instrumento da própria política tecnológica.

A opção entre uma teoria positiva e uma teoria dialética da tecnologia consiste em que a primeira vê a tecnologia como uma seqüência de fatos consumados, enquanto a segunda vê os processos sociais que geram tecnologia e que conduzem a superação de tecnologias. Para a primeira a tecnologia é um fator de produção, isto é, substitui trabalho num movimento unilateral que materializa o controle do capital sobre o trabalho através do processo de produção. Para a segunda, a tecnologia representa a relação conflitiva entre os interesses do capital e os do trabalho, onde os trabalhadores são forçados a se adaptarem aos deslocamentos nos requisitos de qualificação que são passados ao mercado de trabalho pela política tecnológica. Ao mergulhar nos processos sociais da renovação tecnológica encontra-se que a imperfeição da tecnologia também resulta em um direcionamento do progresso tecnológico que o torna indiferente aos resultados sociais da tecnificação da produção. A queda do efeito emprego dos investimentos ou a perda de mobilidade dos trabalhadores são aceitos como inevitáveis, mas não se penetra nas razoes que fazem com que isso aconteça. A revitalização da tecnologia implica em voltar aos seus fundamentos e questionar seu sentido de finalidade. Por isso, e para situar o desenvolvimento da tecnologia frente a necessidades específicas da reprodução do sistema produtivo em sua composição de hoje, tornam-se imperativas novas iniciativas do Estado, na identificação de setores estratégicos e na formação de quadros técnicos especializados, capazes de conduzir a política de tecnologia.


Bibliografia

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GEYMONAT, l.,
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-------------------O imaterial, São Paulo, Annablume, 2006.
--------------------- Crítica da divisão do trabalho, São Paulo, Martins Fontes, 2001.
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STENGERS, Isabelle, A invenção das ciências modernas, São Paulo, Editora 34, 2002.
WHITEHEAD, Alfred, La ciencia y el mundo moderno, Buenos Aires, Losada, 1949.

Notas

[1] A noção de trabalho universal historicamente constituído já se encontra plenamente desenvolvida na Fenomenologia do Espírito (2003), mas recebeu um tratamento mais explícito nas Lições sobre a filosofia da história universal (1986) e um desenvolvimento adicional, na articulação da filosofia da natureza com a filosofia do espírito, na Enciclopédia das Ciências Filosóficas (1997). Na visão de Hegel o trabalho universal não está socialmente diluído. Pelo contrário, ele carrega todos os significados da interdependência que faz com que o trabalho de um escultor corresponda a uma compreensão estética de um arquiteto e onde a engenharia militar responde a uma compreensão de autoridade e de Direito. O trabalho universal sustenta uma capacidade de perceber problemas fundamentais e, portanto, de praticar uma filosofia historicamente conseqüente.
[2] A ciência antiga, tal como foi codificada por Aristóteles, foi um corpo de conhecimento operacional que tinha a técnica incorporada. Era plenamente consciente da técnica enquanto modo visível dessa operacionalidade. Nesse plano, a discussão da tecnologia é uma continuação do debate sobre o fundamento epistêmico da ciência, onde ciência é sempre um conhecimento de princípios generalizáveis e consistentes. Daí, o esforço de Aristóteles de separar o mundo da ciência de tudo que é contingente. Veremos que há um retorno a essa posição no que vem sendo a ciência ultra-moderna que procura se separar das simplificações do Iluminismo.
[3][3] Será preciso retomar a linha de argumentação Jean Paul de Gaudemar sobre a mobilidade do trabalho na acumulação de capital, onde se consideram condições cambiantes de mobilidade para diferentes tipos de trabalhadores e onde o movimento de acumulação de capital implica em alterações nas condições de mobilidade de diferentes grupos de trabalhadores.
[4][4] Não se pode ignorar a contribuição de André Gorz a este debate (2003; 2005) mas tampouco há fundamento na sociedade ultra-moderna do capital para admitir um descolamento real entre o trabalho direto e o indireto e entre o trabalho engajado na produção de mercadorias palpáveis e o trabalho que faz serviços. A esfera do suposto imaterial de que nos fala Gorz reflete de fato uma determinada modalidade de deshumanização da economia que não se sustenta mais que o capital especulativo sem fundamento na produção.
[5] No que denomina de despotismo da fábrica, André Gorz (2001) argumenta que a escolarização não incorpora objetivos de qualificação efetiva das pessoas, mas que responde sempre a momentos anteriores de tecnologia ou aos objetivos de fragmentação do trabalho. Diremos que há uma diferença fundamental entre visão de totalidade, tal como em clínica geral, e ensino de generalidades.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

ARTIGO

CICLO E CRISE NA ECONOMIA DE HOJE
.
Neste ensaio defendo a tese de que a atual crise mundial impõe que se recuperem os elementos de análise das tendências do sistema de produção, já seja ela definida como teoria da crise ou como teoria dos ciclos econômicos, que foram descartados pela análise econômica hoje considerada ortodoxa. A crise é parte do dinamismo do sistema e só pode ser explicada por uma análise com fundamento histórico, não se dobrando aos argumentos de uma análise atemporal. O tempo aqui é uma composição de processos de diferente duração e velocidade, que aparece de diferentes modos para os diversos participantes da vida econômica. Ciclos da atividade econômica e crises descartam a análise estática como instrumento idôneo de análise para trabalhar com processos econômicos que se realizam em tempo real. A percepção estática da teoria econômica, que em sua essência é a da teoria marginalista, a nosso ver representa um notável empobrecimento conceitual da análise social, determinado por ter se organizado a partir de uma visão imóvel da economia comparada com uma abordagem focalizada em suas transformações.

No mundo da teoria econômica há uma contradição entre a necessidade de explicar a realidade da economia e a opção por uma abordagem que organiza o raciocínio analítico a partir de uma situação hipotética de ausência de tempo e onde se vive sempre em condições de escassez relativa. A opção por uma análise estática pode ter um fundamento técnico ou uma raiz ideológica. Pode decorrer da dificuldade de combinar conjuntos de séries representativas da mudança em suas diversas manifestações, mas não se pode descartar que essa opção corresponda a uma leitura do processo do capital, em que o modo ideal de funcionamento do sistema já é o do capital avançado de hoje. O fim da história não foi inventado por Fukuyama, já era um preceito vitoriano, representativo da eternidade de um poder próximo de seu declínio. Marshall defende expressamente o uso da teoria para defender os interesses do Império Britânico
[1]. A história parece ter chegado ao fim para os pensadores que representam as nações hegemônicas que apenas pretendem manter suas posições, mas não tem fim algum para os que vêm processos contraditórios e condições transitórias de poder.

A exclusão do tempo como categoria explicativa de processos sociais impede que se percebam a complexidade e os desdobramentos da crise. Os simulacros de dinâmica introduzidos como analises intertemporais não vão muito mais longe que a análise estática comparativa de Marshall. A mesma estratégia de tratamento do tempo foi adotada por Hicks (1965), que ofereceu uma leitura comparativa de alternativas de deslocamento da abordagem estática. O desafio, já incontestável, de produzir uma política econômica adequada à luta contra a crise, que expresse as necessidades e os pontos de vista dos países periféricos, obriga a recompor os alicerces da análise econômica e sacudir de uma vez por todas os fantasmas da teoria econômica construída a serviço do grande capital.

A noção de crise ocupa um lugar central na teoria econômica, porque é parte da própria concepção do sistema produtivo enquanto processo que combina temporalidade com territorialidade. Os economistas denominados Clássicos, que fizeram a ponte entre o Iluminismo de Smith e o liberalismo de Stuart Mill, ligaram essa ordem do tempo e da formação dos territórios ao desenvolvimento da capacidade de produzir, que presumiram que fosse um processo universalizante, oscilando entre condições de excelência no centro social da formação do capital e condições de subalternidade em sua periferia. Vemos que a linha de crítica histórica, de Sismondi a Marx, representa uma recuperação de um tempo histórico concreto, incompatível com generalizações que não explicitem sua base factual. Este controle histórico das generalizações seria um dos principais argumentos da crítica de Dobb à crítica da teoria que se forma no ambiente keynesiano
[2].

A relação entre o sistema produtivo e o sistema de recursos naturais, foi primeiro apresentada como uma articulação de fatores de produção – terra, capital e trabalho – passando por cima do fato que se trata de uma inter-relação dinâmica entre o capital, o trabalho e os usos dos sistemas de recursos naturais. A suposição de continuidade do processo de produção e de crescimento do produto tinha sido objetada pela doutrina de Ricardo, mas seria posta de lado pelo marginalismo de Jevons e Menger, que restringia o escopo da análise econômica a um jogo de relações imediatas em que os ajustes dos fatores de produção não dependiam de restrições de oferta. Ideologicamente, o marginalismo austríaco bebe na fonte da doutrina da racionalidade do kantismo e o marginalismo inglês no individualismo de Hume e Bentham. Mas, em sua construção de um aparelho de análise, converge em uma resposta à análise estrutural histórica e oferece uma linha de explicação do funcionamento do sistema em que não se diz, mas se presume a velha tese da harmonia social apadrinhada pelo conservadorismo francês de Bastiat e outros. Em suas origens, inglesa e austríaca, o marginalismo é uma proposta de análise que pressupõe uma racionalidade uniforme de todos participantes da atividade econômica, que vê como eventos isolados
[3]. Por seus fundamentos categoriais, a análise marginalista não está qualificada para analisar processos, senão para explicar mecanismos que descrevem situações.

O mecanicismo marginalista está antecipadamente desqualificado pela análise de Marx, mas a linha de análise burguesa perseveraria com pressupostos de escassez relativa, concorrência perfeita e demais artefatos de uma microeconomia insensível às reais condições de diversidade do mercado de capital e do mercado de trabalho. O fantasma da análise do equilíbrio continuava a assombrar a academia e encontraria suas expressões mais sofisticadas no reducionismo da análise estática de Walras e no reducionismo microeconômico de Schumpeter. A questão relativa a um equilíbrio dinâmico, isto é, onde as relações entre variáveis resultam em crescimento do produto, dependeria, em última análise, que se explique como o crescimento do produto resulta em expansão do capital que sustente a continuidade do crescimento do produto social. Esta é a luva recolhida por Harrod de um duelo cujos termos foram estabelecidos por Marx.

A visão de Marx, de um sistema que progressivamente se amplia e se torna mais instável, contempla um aspecto interno do desenvolvimento do sistema produtivo e um aspecto externo, das inter-relações entre a produção e o consumo, que estão na raiz da crise de superprodução. A reprodução ampliada envolve mudanças nas correlações políticas de forças, junto com a transformação tecnológica. A grande novidade dessa abordagem é que nela o fundamental é a interação entre os movimentos interno e externo. Nessa perspectiva, a expansão da esfera financeira e o aumento do capital fictício acentuarão essa instabilidade, que passará ser um aspecto da transformação qualitativa do sistema. A reprodução ampliada do sistema produtivo está condicionada por uma lei geral do capital, que consiste, precisamente, em acumular concentrando e desvalorizando. A argumentação de Tugan-Baranowsky de que a produção capitalista se enfrenta necessariamente com falta de mercado focaliza em um aspecto da doutrina de Marx sobre a crise, em que as crises resultam de movimentos temporalmente situados do capital, pelo que não podem ser descritos por uma mecânica do processo. A crise de superprodução no sentido dado por Marx resulta da tentativa dos capitalistas individuais aumentarem sua taxa de lucro e não se confunde com falta de mercado, que significa apenas que não há quem compre o que alguns desejam vender. Os capitalistas tentam impor produtos que querem vender e que não necessariamente correspondem às necessidades ou aos desejos dos que podem comprar.

A teoria da expansão em espiral do capitalismo foi substituída pela abordagem de Leontief, que apesar de trabalhar com coeficientes de tecnologia que indicam densidade de capital, substituía a análise estrutural histórica de Marx pela análise estrutural estática de Walras. A identificação de ciclos de longo prazo a la Kondratieff, ou as análises empíricas sobre longo prazo como a de Kuznets, correspondem a uma clivagem ideológica que é incompatível com a análise neoclássica que é aceita como corrente principal.

Obviamente, ao circunscrever o horizonte da análise à esfera de relações instantâneas perdia-se a possibilidade de tratar com a crise. Nesse aspecto, a análise de Keynes não difere muito da tradição marginalista, no que ela se fixa no horizonte de possibilidades de aplicações do capital num dado momento, com uma composição de capital e com uma estrutura de mercado. A suposta heterodoxia keynesiana não passaria de uma briga de família, onde a maioria neoclássica ficaria com a representação dos interesses do grande capital internacionalizado. Daí, a importância de alguns desdobramentos do corpo teórico da corrente keynesiana, representados, principalmente, por Roy Harrod, Nicholas Kaldor e Joan Robinson
[4].

A teoria marginalista, especialmente a versão austríaca de Böhm-Bawerk, surgiu como um movimento anti Marx, do mesmo modo como a sociologia de Max Weber, se bem que de modo mais estruturado e explícito. A mecânica do sistema segundo a perspectiva de Böhm-Bawerk está na teoria dos juros, por onde pode ser considerada hoje. Mas é uma análise dos dados imediatos da realidade. Por isso, é uma tautologia dizer que há uma objeção insuperável da análise histórica ao marginalismo. No campo da economia ortodoxa, as objeções ao estreitamento conceitual surgiram logo na década de 1950, com os trabalhos de autores como Harrod, Domar, Myrdal, Lindahl, Kalecki, numa macroeconomia sintética e com autores como André Marchal, que ligou a bifurcação entre macro e microeconomia à análise de sistemas dinâmicos. O menosprezo dos saxões pela teoria das demais nações, que foi ambígua em relação com os russos, mas que revelou sempre um atraso na leitura da teoria
[5], é outro fator que tem pesado como um modo de alienação da teoria dominante[6]. O argumento de empobrecimento cultural revela-se aqui em toda sua força. Salvo melhor juízo, a corrente central neoclássica é praticada por pessoas de pouco conhecimento teórico e grande destreza matemática. Esse é um modo e um caminho de alienação que deve ser sopesado, quando está em pauta a consistência material da teoria em vez da consistência formal dos modelos.

Teremos que ser muito cuidadosos em nossa leitura do processo geral de alienação no capitalismo tardio, porque estamos diante de um processo que atinge a sociedade do capital em seu conjunto, envolvendo diferentes condições de subalternização, começando por aquelas que envolvem as nações sócias menores da hegemonia e estendendo-se à alienação das elites dos países periféricos. A alienação não se explica em sistemas nacionais fechados porque se realiza em relação com movimentos previstos dos capitais específicos com sua internacionalidade, pelo que ela se torna sócia do capital financeiro tal como já foi sócia dos interesses industriais.

A alienação é o movimento que dá inicio à subalternidade. A subalternidade da análise econômica brasileira aos preceitos das grandes universidades norte-americanas revela outra dimensão desse problema, onde o empobrecimento teórico vem de mãos dadas com uma manifestação de alienação. A descontrução da esquerda no Brasil certamente se apóia na justificativa do discurso único na política econômica[7].
Na prática, hoje se vê à exaustão que a política contra a crise, tanto na esfera nacional como na internacional, se organiza como uma política de defesa do sistema financeiro internacionalizado, principalmente mediante apoio ao sistema bancário. O estoque de mágicas que ela tem a oferecer é pequeno e muito repetitivo.

Na teoria em seu conjunto já estava estabelecida a fratura entre os que vêm a atividade econômica como um processo que tende à crise e os que vêm as crises como eventos incidentais ou como desvios no funcionamento do sistema capitalista de produção. A grande crise de 1929 abalou a confiança na análise econômica e abriu caminho para a aceitação dos preceitos keynesianos, mas a história econômica e política escrita depois dela contribuiu para um reducionismo financeiro que passou para um segundo plano a problemática da articulação entre o sistema de produção e o sistema do financiamento.
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Esta grande crise econômica, que marca uma mudança no modo de acumulação na economia mundial com uma mudança no perfil da hegemonia norte-americana e do bloco hegemônico liderado pelos EUA, surge como uma crise interna do sistema financeiro, mas se alastra ao sistema produtivo e passa a modificar as condições de formação de capital e de distribuição da renda. Em sua progressão, a crise torna necessário reavaliar os mecanismos de produção social da crise, os mecanismos de difusão e os da política e econômica. Ao situar historicamente o conjunto dos processos que configuram o processo da crise, encontramo-nos na necessidade de retomar os fundamentos conceituais e de método da teoria dos ciclos econômicos e rever os fundamentos conceituais e analíticos da explicação da crise. Há condições para aceitar que esta crise é um incidente ou uma perturbação do sistema produtivo, ou será preciso tratá-la como parte de uma inflexão do sistema mundial de poder?

As crises econômicas aparecem como eventos que alteram as relações de produção e de consumo e que modificam as relações políticas e institucionais em geral. As crises são rupturas de modos habituais de reprodução do sistema de produção que deslocam expectativas, esgotam possibilidades e abrem novas oportunidades de formação de capital e de distribuição da renda. A crise que inspirou todo este trabalho e que não sabemos como terminará, é a que está associada ao declínio da hegemonia dos EUA, interposta entre os custos de sua sustentação e os da aliança básica que o sustenta. Os mecanismos da hegemonia não são somente financeiros nem muito menos, mas englobam as diversas relações de poder que ganham visibilidade através da emergência da esfera financeira. O poder ganho pelo sistema financeiro depende de sua aliança com o poder político e realizou uma operação fundamental de descaracterização dos papéis tradicionais das classes na acumulação industrial.
A crise revelou um limite interno no funcionamento do capital financeiro, que é dado por diferenças de comportamento dos detentores individuais de capital. As ações individuais refletem condições concretas de participação no mercado e condições de perceber o funcionamento do mercado. Logicamente, convivem percepções diferentes das condições de comercialização que prevalecem na esfera globalizada da economia de hoje.
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Tudo isso envolve um problema de método. Se vamos dar um tratamento científico à temática da crise, teremos que rever os fundamentos da teoria dos ciclos, que tratou as oscilações da atividade econômica como uma decorrência das condições da formação de capital. André Marchal cita duas classificações propostas por Ernest Wagemann para as indústrias, segundo sua densidade de capital e segundo a organização do sistema produtivo. Na prática, isto significa eliminar ou superar a divisão entre as abordagens de macro e microeconomia, passando a focalizar nas conexões entre esses dois níveis. Está claro que teremos que considerar a ligação entre as abordagens macro e microeconômica e com a composição de curto e longo prazo, portanto, de como as ações individuais das empresas se convertem em tendências gerais. A densidade de capital de que nos fala Wagemann não é outra coisa que a composição atual do capital de Marx, que logicamente terá que ser vista como em situações diferentes de um país a outro. Para nós, a questão da densidade de capital se coloca em termos da composição orgânica do capital considerado setor por setor, dadas as características limitativas do aumento da densidade de capital segundo as condições sociais e técnicas requeridas para incorporar tecnologia. Esta será, em todo caso, uma definição das condições de sensibilidade das diferentes economias nacionais à formação e ao desenvolvimento de movimentos cíclicos. O reconhecimento de que as diferenças estruturais entre economias nacionais são essenciais aos movimentos gerais dos ciclos obriga a rever a leitura monetário-financeira hoje prevalecente. Essa tem sido uma leitura formalista da forma financeira do capital, que abstrai seus aspectos culturais e institucionais, isto é, que não considera, por exemplo, o papel da especulação financeira que, a rigor, é a compra e venda de produtos que não foram produzidos, ou de formação de preços mediante falsas sinalizações de compra.

Não se trata apenas de uma quantidade de capital fictício senão do modo como a formação de operações sobre bases fictícias passa a representar as sinalizações de preços com que opera o sistema produtivo. Vemos que essa contaminação da produção pela não produção se torna a mola propulsora dos investimentos em atividades novas, em que é preciso desviar demanda de certa composição de consumo e onde não há criação de demanda. Pelo contrário, no ambiente da concentração de capital e desemprego tecnológico não há como pensar que o mercado se desloque através de ampliações de demanda na base do consumo. O sistema tende a operar segundo as pautas de demanda dos grupos de altas rendas
[8] e com a temporalidade do mercado financeiro integrado (Braga, 1998), que não necessariamente é percebida pela maior parte dos investidores individuais. Visões em falso da realidade do mercado levam a comportamentos essencialmente irracionais. O quesito da racionalidade é fundamental na determinação do comportamento do mercado, onde se combinam ações planejadas com ações intempestivas e onde a erraticidade de fato está sempre ligada a previsões sujeitas a margens de erro variáveis.

A crise ressalta a polaridade entre a esfera dos interesses individuais e a dos interesses coletivos, e com ela, dá novo significado à distinção entre a esfera pública e a esfera privada. Os interesses coletivos ficam identificados com a política econômica nacional, que finalmente se revela como representativa de interesses de classe. Com a ascensão do capital financeiro à posição de protagonista principal do poder econômico, configura-se um quadro de conflito em que Estados militantemente capitalistas, apesar de suas convicções, operam no sentido de desprivatizar, ou mesmo de estatizar instituições financeiras. Assim, em vez de focalizar na distinção entre público e privado, se passa a apontar às interpenetrações dos interesses da esfera pública e da esfera privada. As alterações na relação entre a esfera pública e a privada revelam-se em sua real complexidade, que transcende a esfera das receitas e das despesas e mesmo a do poder de regular o mercado. O verdadeiro poder do Estado na economia está em sua capacidade de escolher seu papel. Este hoje é o real fundamento da questão em torno da possibilidade de seguir uma política neoliberal ou de reconhecer quando e como o Estado escolhe um modo de intervenção na economia, que pode ir desde o financiamento de empresas deficitárias, o estabelecimento de prioridades de financiamento, o controle de instituições financeiras o controle de operações de monopolização de determinados mercados, ou mesmo a decisão de intervir para proteger os setores sociais mais desfavorecidos. A oportunidade da crise mundial mostra como os diversos governos nacionais escolhem políticas econômicas que representam a composição de forças políticas que representam.


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[1] Alfred Marshall, Industry and Trade pp.1
[2] O foco da crítica de Dobb é à fundamentação de modelos sintéticos de crescimento que tomam como consensual a fundamentação prática da análise. A construção de modelos leva subsumidas polêmicas sobre conceitos e modos sociais de usos de conceitos. No ambiente da corrente keynesiana houve uma desqualificação de problemas ontológicos que permitiu ao próprio Keynes reduzir os trabalhadores à condição de consumidores. A premissa teórica que sustenta a propensão a consumir consiste em igualar todos que não são capitalistas e em presumir que todos eles são membros de uma classe média plástica que envolve a todos.
[3] Esses eventos isolados correspondem aos “fatos atômicos”de Wittgenstein. O fio condutor da afinidade entre esses autores é uma ontologia burguesa, cujo projeto de poder justifica o grande esforço feito por Lukács em mapear a ontologia de Hegel e de Marx.
[4] Em vez da opinião de Shackle, de que esses autores levaram o quadro keynesiano de análise ao limite, entendo que eles romperam com os preceitos de Keynes sem jamais terem admitido essa cisão.
[5] Considerar, por exemplo, as histórias de que Joan Robinson teria sido a primeira a valorizar o trabalho de Wicksell e de Kalecki e o mal disfarçado menosprezo dos acadêmicos brasileiros treinados nos EUA pelo trabalho teórico que se faz fora de seu horizonte imediato de leitura.
[6] A leitura da teoria econômica na perspectiva da teoria da alienação ganha um significado especial porque representa um questionamento dos fundamentos conceituais da teoria e não de sua instrumentalidade.
[7] A desconstrução tem bases históricas concretas e cabe ver a argumentação de Fernando Cardim de Carvalho(2005) quando contrasta os efeitos da corrupção em larga escala – diremos institucionalizada – e as prioridades de investimento.
[8] Por contraposição às pautas de demanda dos grupos de renda médias, deste modo inserindo rupturas na composição da demanda que terão repercussões finais na composição da produção segundo essa demanda das altas rendas é mais garantida que a dos grupos médios de renda.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

ENSAIO

ADMINISTRAR PROCESSOS POLÍTICOS CONFLITIVOS

Fernando Pedrão
[1]

“é preciso sempre distinguir entre a alteração material (...)das condições econômicas de produção e as formas jurídicas, políticas (...) em resumo as formas ideológicas pelas quais os homens tomam consciência deste conflito “Karl Marx


Um ponto de partida
As relações de poder carregam elementos de conflito que devem ser examinados, segundo eles se apresentam na sociedade periférica moderna. O estudo da combinação de conflito e ajuste demarca o campo de uma teoria da ação social, ou melhor, de uma teorização sobre o agir social que envolve práticas, instituições e modos de vida. Trata-se, portanto, de focalizar nos processos do poder e não nas pessoas que podem, eventualmente, deter frações de poder. No ambiente do processo moderno do capital, a identidade das pessoas surge de sua inserção no mundo do prático ativo, que identificamos por contraste com o prático inerte trabalhado conceitualmente por Jean Paul Sartre como expressão da praxis superada
[2]. Mas esse processo é o da crise de acumulação de capital, onde ocorrem modificações nas relações entre capital e trabalho, resultando em rupturas dos processos políticos com subversão de protagonismos.
Perante esse ambiente de acumulação sujeita a crise, nosso ponto de partida é a diferença que se encontra hoje entre a ciência social que reconhece o papel central do conflito de interesses na sociedade do capital e a que se propõe apenas a operacionalizar os interesses predominantes na esfera de cada nação. Os conflitos não são incidentais como as crises econômicas não são casuais. A suposição de um interesse nacional colocado acima de interesses materiais é uma premissa maravilhosa ao gosto do Absolutismo seiscentista de Richelieu e de Hobbes, que mostra porque ele foi absolutista. A formação da sociedade burguesa tornou necessário reconhecer relações de classe e o colonialismo obrigou a reconhecer as relações entre centro e periferia. Por isso, o discurso da ciência social européia não registrou o papel da colonização na formação das classes sociais. Com essas restrições, as ciências sociais oscilaram entre criatividade e operacionalidade, onde perderam rumo, tornaram-se serviçais do poder organizado, mas tiveram que voltar sobre seus passos para reconhecer a pluralidade do mundo social de hoje.
Este ponto de partida nos leva a tomar a visão histórica como divisor de águas entre as ciências sociais capazes de refletir a totalidade histórica real e as que se contentam com aspectos arbitrariamente escolhidos do mundo real. Tudo que é local é parte de uma totalidade que tampouco se resolve sem se materializar em regiões e cidades. O campo da administração se configura como o campo onde se gere o que já existe, portanto, é o campo da praxis inerte
[3]. Na linguagem kantiana é o campo do entendimento.
No campo da Economia Política essa divisão se converte em ruptura entre a teoria econômica derivada da análise da economia nacional e a teoria econômica do capital. Rejeitada pelo poder estabelecido, a Economia Política reaparece para ver como os interesses suplantam as neutralidades quando se trata da sobrevivência do poder. Frente a situações de conflito de interesse e situações de crise, reaparece um preceito fundamental da Economia Política que é a ligação entre as trocas e os interesses que as determinam, isto é, a relação orgânica entre a esfera do poder político e a do poder econômico.

Origens que se reproduzem
A percepção do conflito como eixo das relações econômicas e políticas se reporta à antiguidade e tem novas leituras atuais. Tratando dos conflitos sociais em Roma, León Bloch em texto memorável mostrou como a capacidade de exercer poder se dividia entre o poder do Senado para decretar guerra e o dos homens ricos para controlarem os ganhos da guerra
[4]. O mesmo já tinha acontecido na Atenas Clássica, no conflito entre a sustentação da democracia de Crítias e o aparecimento de um projeto imperial de Péricles. No Império Romano tardio, Adriano criou uma administração pública copiada do velho império persa Aquemênida, que foi mais tarde modernizada pelo Império Sassânida, e copiada pelo Império Bizantino que, em todas essas situações, gerou um poder estruturado em classes. A origem bizantina da administração moderna aparece nessa tendência a tomar os meios como fins. Na Espanha Islâmica, Al Mansur substituiu um califado aristocrático por um populismo militar esclarecido, antecipando o estilo de Napoleão I, alterando as posições de classe das etnias. Na Renascença, em seus Discursos, Nicolo Machiavelli retoma esse tema mostrando como o Senado pôde prolongar sua esfera de poder controlando a nomeação de cargos administrativos e descobrindo que se torna necessário contar com métodos administrativos compatíveis com a segurança do Estado[5]. O Império Britânico surgiu copiando o estilo de administração desenvolvido no Império Português e reproduzindo a política do Mare Nostrum com a Comunidade Britânica de Nações. Inútil procurar criatividade nesse processo. Nos Tempos Modernos vamos encontrar Napoleão I criando um estilo de administração pública apoiado numa concepção de educação[6], e, logo a seguir, com a consolidação do Império Britânico, nos deparamos com Thomas Macaulay propondo um estilo de educação para a elite inglesa administrar o Império. A seu modo, os norte-americanos desenvolvem uma política de educação para sustentação de seu grande projeto imperial, com iniciativas previsoras de fortalecer suas universidades[7] e de usar a cooperação internacional como fator de cooptação das elites de outros países. Estágios, intercâmbio etc., tal como os faraós faziam com os semitas. Definem um estilo de universidades com forte acento em pesquisas empíricas e num estilo pragmático de ensino que funciona como bloqueador de contradições e de dissidências. Ciência política construída a serviço da ordem e operacionalizada mediante modelos comportamentais onde os comportamentos são mecanicamente racionais e invariantes etc. Uma universidade liquefeita dividida entre o ensino de generalidades para a maioria e ensinos coisificados de materiais peritos para segmentos seletos de operadores do sistema. O sentido pejorativo do termo perito, ressaltado por Anthony Giddens, torna-se claro nesse contexto. O perito é sempre um observador externo sem motivações ideológicas. Em sua forma mais pura é o personagem de Max Frisch, que simplesmente declara que não é Stiller[8].
Esse estilo foi desenvolvido com mais rapidez na Alemanha de Bismarck por Von Rathenau, que veio a ser o pioneiro da incorporação da tecnologia à pedagogia. A sacralização da tecnologia tornar-se-ia um argumento decisivo para excluir a vertente crítica do aprendizado e criar o autoritarismo velado do pragmatismo. Não se estudam processos e estruturações sociais, estudam-se casos, que são situações isoladas que não se reproduzem, que não fundamentam generalizações. Os estudos de caso são a negação da ciência social e confundem análise aplicada com pesquisa laboratorial. É um passo decisivo no caminho da biologização do mundo social
[9].
Em seu cerne, a opção pela modernização, como movimento necessário à sobrevivência política das nações, estabelece quais conhecimentos são “úteis” e quais devem ser processados com a maior rapidez possível e ao menor custo social. O utilitarismo se torna um reducionismo da complexidade do campo social que associa virtude a sentido prático e passa a olhar com suspeita todo intento teórico. A inutilidade do pensamento abstrato, por antecipação, cerceia toda possibilidade de crítica da ordem estabelecida. A visão do utilitarismo de Bentham combina a função social de utilidade com a preferência individual pela combinação de riqueza e conforto. O conforto feliz dos indivíduos que são integrados na ordem política. Na verdade, como demonstrou Marx, o capitalista individual está preso numa engrenagem de luta pela mais valia e pela sustentação de sua participação em mercados que perdem impulso e onde a concorrência é modificada pela concentração do capital. A versão norte-americana do pragmatismo – Dewey, James etc - pretende ter status de filosofia e funciona como fator de homogeneização dentro do espaço do Império. Politicamente, é uma excelente ferramenta de controle social, que permite decidir o que deve ser ensinado, o que vale a pena aprender e o que pode ser impunemente ignorado, ao construir uma linguagem analítica baseada em individualismo e formalismo. Essa perspectiva imediatista torna-se um instrumento eficaz para criar uma ignorância socialmente legitimada. O utilitarismo torna-se uma pseudo-filosofia das práticas administrativas, que descarta as inter-relações entre seqüências de ações, progressões de conhecimento e conflitos de interesse. As relações de classe ficam diluídas atrás de situações técnicas.
Na modernização avançada ou na alta modernidade, como fraseia Giddens, (1991), surge uma contradição entre o suposto implícito de ações individuais que podem se repetir indefinidamente e as condições ambiente para essas ações, onde se encontram os elementos de rupturas entre padrões de tecnologia e padrões de comportamento. A diferença entre repetição e inovação responde pela capacidade de registrar como a realidade social consiste em repetições ou registra novidades que devem ser reconhecidas e processadas. Acontece que o simplismo mecanicista da análise econômica da indústria regida pelos padrões da segunda revolução industrial não consegue registrar a combinação de continuidade e rupturas e trata a administração como um processo contínuo. A antropologia trouxe temas tais como identidade e cultura, que obrigam a reclassificar os resultados daquela análise econômica superficialmente complexa do formalismo neoclássico, para uma análise reflexiva, capaz de recuperar elementos de experiência exatamente do mesmo modo como se trazem peças arqueológicas a novos usos. Nada como fazer chá em porcelanas da dinastia Ming. A lembrança de Foucault nessa garimpagem de elementos culturais e técnicos é obrigatória. Vemos como a problemática da subjetividade tem que ser administrada com um sentido de atualidade, para não cair na tentação das soluções individuais e da redução de tudo ao cotidiano, tal como ficaríamos em mundo maffesolistico
[10].
Há situações variáveis de poder e condições constantes para o exercício desse poder e a visão em perspectiva histórica mostra que há um princípio ancestral de poder que se reproduz nas formas mais complexas da economia e da política. No ambiente da modernidade construída como meio do poder da burguesia ascendente estabeleceu-se uma presunção de que os componentes constantes superam os variáveis e que o sistema socioprodutivo opera com confiança suficiente para sustentar previsões de mercado também suficientes para garantir rumos compatíveis com a reprodução do capital acumulado. Noutras palavras, a administração positiva da hegemonia excluiu a incerteza e baniu os conflitos de classe. A crise da bolsa em 1929 trouxe uma nova visão de que o sistema é essencialmente instável e demanda algum tipo de controle. Criava-se aí uma nova relação entre Estado e governo que estaria por trás das grandes opções entre políticas de planejamento e políticas de livre mercado. O fundamento de relações de classe na configuração operacional do Estado seria o tema por excelência das pesquisas de Althusser e de Poulantzas, que trabalhariam com as condições de administração inerentes à estruturação em classes do Estado moderno. Esta nova crise em marcha, da esfera globalizada, mostra a rejeição dos países líderes a reconhecerem os processos históricos da formação das crises e sua insistência em tratá-las como eventos incidentais. Frente à crise atual, em momento algum se fala do peso das despesas militares nem se reconhece que o endividamento do centro hegemônico é um fator determinante de crise. O custo social do poder é um dado central da questão que se obstinam em ignorar, mas que marca o que há de novo e o que há de velho nesta crise econômica que também é uma crise da hegemonia. Os estados nacionais mais recalcitrantes neoliberais, saxões e outros ad lateri, passam a propor que o Tesouro norte-americano passe a fazer parte de bancos privados.
Na esfera da modernidade capitalista essa linha de tensão resultou, primeiro, no confronto entre o planejamento direto do lado socialista e o indireto, de inspiração keynesiana. O verdadeiro perfil mundial do problema surgiria nas diferenciações entre o grupo das nações mais ricas e o das mais pobres e entre as nações com economias ascendentes e as nações com economias estagnadas. A perspectiva keynesiana está representada pelas contribuições de Nicolas Kaldor, pelos aspectos de política tributária e pelos aspectos de distribuição da renda, que já foi objeto de trabalhos meus anteriores
[11] e de Anibal Pinto[12], quando pensávamos ser possível uma ressurreição pós-ricardiana marxista. Nos anos seguintes, a revelação do fundamento conservador desse neo-ricardianismo, alinhado com os neo-keynesianos monetaristas, mostrou a futilidade dessa tentativa.

Contradições nas desigualdades
O aparecimento de teorias do desenvolvimento revelou a distância entre a problemática de governo nos países centrais e nos periféricos, entre administrar para manter padrões já alcançados de tecnologia e conforto e administrar para sustentar uma transformação de uma economia em expansão onde viabilizar a substituição de padrões de tecnologia e de liberdade. A concepção de condução das economias nacionais previa um ministério do interior, um ministério da fazenda e um ministério da justiça. A introdução de ministérios técnicos e de órgãos especializados é um sinal do reconhecimento de que o governo deve ser o meio de transformação operacional do Estado.
Os problemas de uma administração pública centrada em desenvolvimento econômico passaram por uma revisão profunda com as experiências acumuladas no Instituto de Planejamento Econômico e Social ligado à CEPAL, que publicou diversos estudos sobre o tema da administração para o desenvolvimento, seguindo a filosofia básica das Nações Unidas, de considerar que a chamada administração para o desenvolvimento representava uma opção pela modernização dos sistemas institucionais e uma democratização das decisões. Essa seria a perspectiva de uma teoria da ação social pública, onde o Estado como tal não é questionado, e onde se vê o governo por sua operacionalidade, como entidade delegada. Frente a ela cabe formar uma visão crítica sobre duas bases. Primeiro com um critério de eficiência filtrado por um critério de justiça social. Depois, com um critério de eficiência compatível com o crescimento da economia. A adoção desses critérios desqualifica a noção microeconômica de eficiência pura, entendida como uma maximização de lucros e uma minimização de custos.
A compreensão de que a ação do Estado tem um peso em direcionar o crescimento da economia dá um significado especial à análise da economia do governo – já então apelidado de setor público – onde a política fiscal teria que ser avaliada sobre um critério de desempenho em períodos longos. Este foi o grande salto da análise keynesiana como ferramenta da explicação da formação de capital, onde se destacou a contribuição de Alvin Hansen, explorando a relação entre a teoria monetária e as políticas fiscais para o controle cíclico e para o desenvolvimento econômico
[13]. A reviravolta neoclássica, que representou o abandono dessas pesquisas sobre o longo prazo, deixou em aberto um problema de ajuste em curto prazo de movimentos que são partes de tendências de longa duração. Essa dificuldade ficou patenteada quando se perfilaram propostas do chamado do planejamento a curto prazo, que foi incorporado ao arsenal da análise do desenvolvimento econômico, identificando-se, entretanto, como o que Giddens denomina de sistema perito, isto é, uma proposta de arcabouço técnico sem ideologia. O dito planejamento a curto prazo foi adotado inclusive pela própria CEPAL[14] e tornou-se uma bandeira do planejamento instrumental empobrecido que se reproduziu nas versões de planejamento estadual condicionado por orçamentos anuais.
Toda essa investida resultaria no reconhecimento de diferenças estruturais entre o tratamento da coisa pública como um atributo da república, ou em condições de indeterminação da forma de governo, ou ainda, sem considerar os conflitos de interesses que se realizam no interior do processo político da república. Os condicionantes históricos do sistema formal de poder, finalmente, foram responsáveis da não operacionalidade do planejamento econômico formal, cujo fracasso deu lugar ao empobrecimento do planejamento enquanto prática de governo. Na perspectiva de Marx a administração é sempre um exercício de defesa de interesses da composição de poder liderada pela burguesia, do mesmo modo como a análise econômica acrítica do marginalismo. Será sempre um exercício de busca de eficiência interna do sistema produtivo, que deve conviver com as conseqüências da concentração de capital e da desigualdade de renda. No Brasil, as incursões no rumo de uma mobilização da modernização através da administração, em que houve tentativas significativas de Rômulo Almeida
[15] e de Celso Furtado no planejamento estadual e no regional, chocaram-se sempre com problemas de fragmentação do sistema de decisões no Estado, que refletem, justamente, a pluralidade e os conflitos de poder que são transferidos para a esfera pública. Em lugar de princípios gerais e de uma lógica formal da administração, trata-se de identificar requisitos e necessidades historicamente determinados de racionalidade, onde se registram as condições históricas do sistema de poder político e econômico. Finalmente, o administrador não é um ente de razão kantiano, nem é um tipo ideal, mas é um operador de uma determinada estruturação de poder, da qual pode ser consciente ou não.

Megido, Armagedon ou a Comuna de Paris?
A centralidade do conflito leva a um conflito principal que define a ordem do poder, a uma disputa que destrói as oportunidades de um poder organizado, ou leva a um confronto revelador das contradições de classe? Megido foi uma luta entre príncipes. O Armagedon é o pesadelo arturiano do fim da monarquia que se confunde com o fim de uma aristocracia do fim do mundo. Mas a Comuna de Paris foi o limite máximo até onde chegaram as pretensões do proletariado urbano de chegar a um mundo internamente dirigido. A Comuna tinha que ser esmagada porque representava uma possiblidade organizativa real dos trabalhadores. Entre nós a grande greve baiana de 1919 tinha que ser derrotada por razões ainda mais profundas, porque representava uma aliança entre operários da indústria e trabalhadores do sistema produtivo pré-industrial e da sociedade pós-escravista
[16]. A revelação do substrato de conflito nos processos políticos modernos identifica grandes opções no tratamento da coisa pública que situam os problemas de administração no campo de uma teoria da ação social historicamente situada. Não nos interessa a visão bíblica de conflito que permite resvalar pela biologização do mundo social que descaracteriza os fundamentos coletivos. Em vez de lutas de identidade dos migrantes mexicanos, a família Sanchez entronizada como objeto de uma antropologia do mundo multi-étnico norte-americano[17]. Interessa o papel das contradições de interesse historicamente situadas. Contra a positivização da administração pública colocam-se as críticas da razão instrumental posta diante da razão dialógica (Habermas, 1987) e as críticas da exclusão dos fundamentos de poder na identificação do sujeito moderno (Foucault, 2004). A reflexividade da visão contemporânea, trabalhada por Giddens, Beck e vários outros, significa na prática que a ação social se faz sobre uma critica permanente de estruturas de conhecimento e de ações pretéritas, estabelecendo um diferencial significativo com a visão positivista e instrumental da administração imediata da coisa pública. A legitimação da administração surgirá de sua capacidade de construir uma visão crítica do real atual. A atualidade do real é um principio fundamental do racional em Hegel, para quem a historicidade das estruturas é um dado indiscutível da reconstrução conceitual do mundo. A positivização desse processo de conhecer tem que ser denunciada como o movimento que desmonta a historicidade do mundo social. Mas a positivização, de Nagel a Popper, não oferece nada que substitua o fundamento das relações de classe. Simplesmente teoriza sobre racionalidade do individuo sem se envolver com as condições sociais da individualidade.
Todos esses movimentos da teoria reabriram uma velha ferida dos estudos sociais, que é a futilidade de propostas explicativas destituídas de significado como teorias da ação social. No mundo da dominação pós-colonial aparecem relações de poder interligadas, que compreendem a hegemonia militar, industrial e financeira junto com a atualização de formas tradicionais de poder, que se infiltram na estrutura política e na das empresas. A análise do conflito torna-se, também, uma análise das composições fisiológicas de interesses que convertem os conflitos de interesses em organizações corporativas, operando com articulação vertical entre as esferas locais e as internacionais. Finalmente, a análise do conflito obriga a esclarecer entre quem e quem ele acontece, pelo que abre questão no relativo a identidade, participação etc. Na sociedade da modernização desigual os conflitos se configuram na desigualdade, determinando, por exemplo, as imensas dificuldades de tratar com os conflitos das grandes cidades. A dialética do conflito torna-se a principal referência desta economia política aplicada.

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Notas
[1] Diretor Geral do Instituto de Pesquisas Sociais, professor da Universidade Salvador
[2] Jean Paul Sarte, Critique de la raison dialectique, (1960)
[3] Cabe referir a análise de José Artur Giannotti sobre esse ponto específico em seu Trabalho e reflexão (1983), que é um discurso antecipatório do debate sobre a reflexividade.
[4] Tacitamente trata-se de um consenso não formalizado, mas as vitórias que rendiam saques para os exércitos abriam o caminho para linhas de comércio cujos lucros formariam os novos homens ricos do Império.
[5] Em boa hora Stuart Schwartz produziu um estudo sobre o papel da burocracia legal na construção do processo colonial no Brasil.
[6] Refere-se à criação do Instituto Politécnico como matriz de um conhecimento incorporado com tecnologia.
[7] É interessante observar como o fortalecimento de universidades foi um objetivo prioritário do general Ulisses Grant quando se tornou presidente da república.
[8] Max Frisch, No soy Stiller (1958)
[9] Ver artigo de Robert Kurz sobre este tema.
[10] Trata-se de uma tendência que encontramos em vários autores, especialmente em Giddens, cuja trajetória incluiu um trabalho primordial sobre a estrutura de classes no capitalismo avançado, mas que se voltou mais para as condições de subjetividade no mundo globalizado. O exemplo de Giddens reflete uma tendência dessa alta modernidade de se fechar em seu próprio círculo de reprodução. A mais recente informação sobre um aumento das dificuldades para casamentos de franceses com estrangeiros mostra como o fechamento do mundo europeu é uma opção cultural e política.
[11] A distribuição da renda e o desenvolvimento econômico (1964)
[12] Distribuição da renda na América Latina e desenvolvimento (1976)
[13] Nesse debate tem lugar especial o Teoria monetária e política fiscal (1954), que precedeu os trabalhos de Abba Lerner e de Nicholas Kaldor, no campo keynesiano e de Michal Kalecki no campo marxista.
[14] Nos anos 70 trabalhos de Jorge Israel, Dardo Segredo e outros, defendiam as vantagens do planejamento a curto prazo para resolver ajustes conjunturais e superar desajustes em orçamentos. As práticas do Ministerio do Planejamento no Brasil na década seguinte, promovidas por Bresser Pereira e seus seguidores acompanharam essa tendência.
[15] Em 1956 Rômulo Almeida então Secretário da Fazenda da Bahia, realizou um programa de modernização da administração pública, com a introdução dos orçamentos por programa, entendendo que a modernização do aparelho governamental seria o primeiro passo para um planejamento econômico e social do desenvolvimento.
[16] O estudo de Aldrin Castellucci (2004) sobre esse evento é um marco da revelação da história verdadeira, contraposta à história oficial narrativa das peripécias dos senhores de engenho.
[17] Arthur Lewis (1964)